quarta-feira, 7 de novembro de 2018

O menino que não sabia ser criança.

Domingo o Baby lembrou-se que queria, porque queria, trazer trabalhos de casa do infantário. Sim, porque sim, porque queria ter trabalhos de casa.

(Porquê? Porque o irmão tem, porque, especialmente em altura de testes, me vê de volta dele e dos livros e porque se o irmão mais velho tem alguma responsabilidade, ele também a quer para ele. Simples.)

Chegados ao infantário segunda feira, a Educadora percebeu logo o que estava em causa (com a simplicidade, que eu sei não ter, de: o irmão mais velho tem, o mais novo quer) e foi peremptória: "Sim senhora, doravante o Baby leva trabalhos para casa." Mas, sim, houve olhares cúmplices e sorrisos mal disfarçados. E o Baby não é totó nenhum. E eu já devia saber que não lhe levar aquilo a sério ia ter um preço. (Este meu filho, este meu filho… Soubesses vós…)

Bom, ao fim da tarde lá fui eu buscar o Baby, mais os seus trabalhos de casa: escrever o nome dele, o do irmão, o dos pais, o da Educadora e o da Auxiliar.

Chegados a casa, lá foi ele sentar-se muito concentrado, a copiar as letras maiúsculas de uma folha que tinha trazido da escola…

- Muito bem, Baby! Fizeste os teus trabalhos muito bem. Amanhã levas para a escola para a Professora ver.

- E eles depois mandam mais?

- Mandam. Foi o que a professora disse, não foi?

- Pois foi...

Eram as 7 da tarde e a noite decorreu calma e sem sobressaltos. Deitamo-nos, adormecemos e tudo bem.

Até que às 2h da madrugada, num repente e do nada:

- MÃAAAAEEEE!!! OH MÃAAAEEEE! MÃEEEEE!

Acordo assarapantada… O Baby?! A chorar? A esta hora? Levanto-me de rompante, meio a dormir, meio acordada… Que teria acontecido??


- Que foi filho? Que foi?!!!

- O que é que eles me vão mandar fazer amanhã, mãe? Diz-me... Tu diz-me..

- Mas eles quem?

- Os trabalhos de casa... O que é que as professoras me vão mandar fazer amanhã?

- Não sei filho… Uma coisa qualquer… 

- Uma coisa qualquer?!

- Sim, filho, alguma coisa… Mas estavas a pensar nisso a esta hora porquê?

- Porque eu sei coisas muito importantes, mãe. Muito importantes!! Elas que nem pensam que me vão mandar fazer sempre a mesma coisa. Letras, sempre letras… Que nem pensem! Eu já sei muita coisa mãe. Muita coisa.

{suspiro}

Quatro anos de gente! Quatro-anos!

(…)

No dia seguinte comentei de manhã, à pressa e à socapa, o ocorrido com a Educadora, que ele tinha dito que não queria fazer sempre letras. Ela sorriu, não a surpreendeu. O dia correu… Fui buscá-lo; trabalhos de casa: desenhar a sua casa, com ele a jogar à bola com o irmão. 

Um desenho… Bonito!

Curiosamente ele na altura não comentou nada... Mas quando foi fazer o trabalho… Que não, que não podia ser... Um desenho de trabalho de casa para ele?! Onde já se tinha visto? Ele queria coisas sérias e ninguém o percebia. 
Marido põe-no a fazer números e contas de somar (here we go again...). O Baby todo satisfeito. Aquilo sim já lhe parecia ter jeito de trabalho de casa.


Eram as 7 da tarde e a noite decorreu calma e sem sobressaltos. Deitamo-nos, adormecemos e tudo bem.

Até que às 2h da madrugada, num repente e do nada:

- MÃAAAAEEEE!!! OH MÃAAAEEEE! MÃEEEEE!

Acordo assarapantada… O Baby?! A chorar? A esta hora? Outra vez?! Levanto-me de rompante, meio a dormir, meio acordada… Que teria acontecido?? Outra vez ou estarei a sonhar?


- Que foi filho? Que foi?!!!

- O quatro mãe… O quatro… Eu fiz um quatro muito torto, mãe.

- Qual quatro filho?!

- O dos trabalhos de casa.. Com o pai… Não consegui fazer bem o quatro. Posso ir fazer outra vez o quatro mãe? Posso? Posso?

E lá fomos nós… De madrugada… Refazer um quatro.

{suspiro}

Quatro anos de gente! Quatro-anos!

(…)

Vai ser bonito, vai…


39 comentários:

  1. Boa sorte, é só o que te desejo...

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    1. Obrigada, babe! (A parte boa é que ainda temos dois anos para trabalhar nisto…)

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  2. Aí, Deus!
    Que amor de miúdo!
    E sim, em dois anos a coisa resolve-se!
    <3

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    1. Às vezes é mesmo muito difícil, I*. É muita exigência (nele e nos outros, mas acima de tudo nele). Depois não tem capacidade de lidar com a frustração, de quando não consegue (a perfeição). Mas bom... Ninguém disse que ia ser fácil... ;)

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    2. E se fosse não acharias piada nebhuma!

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    3. Eeeerrr…. Quando tudo na tua vida já é um desafio, se calhar agradecias uma abebiazita… ;)

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    4. sim, tens razão!
      mas esquece, não vale a pena pedires isso...
      não como que te "cai no colo".
      constrói tu essa "abébia", esse porto seguro. até o que o universo decida que tb o vai tornar num desafio. e se assim o fizer, podes tomar duas decisões: ou continuas a tentar resolver o desafio, e crias um porto seguro novo; ou desistes e crias um porto seguro novo.
      claro que este tipo de raciocínio não se adequa aos que não "caem no colo" (como crias e afins ;))! apenas aos cenários/vivências/cenas que são construídas e aceites por nós!

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    5. Pois… Dele não desisto. :)

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    6. credo, nem era isso que estava a dizer, deus do céu!

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    7. Devolver também já não passou o.prazo... :D

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    8. já não cabe!
      :| 8ai credo, escrevi o que pensei?)

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    9. Ahahahah "já não cabe"...

      (no worries babe, percebi perfeitamente do que estavas a falar...)

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  3. Vou dizer a Nê Mê querida o mesmo que digo a esposa amada...
    Desde quando é que isto é uma democracia? Façam tudo o que a criança quer, façam! :D :D :D :D
    (Tenho a dizer, Nê... Tens aí um que vai sair fresquinho que nem um Picolé!)

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    1. Acredita que não é por aí, Silent! É outra coisa... Beijinhos

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  4. Creio que eu e o Baby partilhamos alguns traços de personalidade: visualizamos um resultado final antes de iniciar a tarefa, muito perfeitinho. Depois iniciamos a tarefa em si, e se o resultado final real ficar aquém do imaginado, a coisa não fica bonita, pois realmente temos que lidar com a frustração. A vantagem é já toparam estes traços no Baby, com 4 aninhos, e ainda têm bastante tempo para o ajudar a aligeirar a pressão que impõe a si próprio.

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    1. A questão é que é tão evidente, tão vincado na personalidade dele, que já topámos isto há seguramente mais de dois anos… Tudo se agrava por ter um irmão mais velho que, evidentemente, faz tudo melhor que ele. E ele não aceita não ser tão capaz, não percebe a diferença de idades… E o que nós tentamos...

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    2. Recorrendo às minhas memórias de infância, (eu que escrevia poemas um par de meses depois de aprender a escrever, que desenhava nus a carvão quando os outros meninos faziam casinhas e sóis, que aprendia a falar línguas estrangeiras sozinha): sou filha única portanto não partilho com o Baby o tal "stress de ter um mano mais velho", mas quase que garanto que se não houvesse o mano, seriam os pais as pessoas a imitar e superar, ou outra qualquer. Agora que sou quasi-quarentona gostaria de enquanto criança ter sido menos séria, ter aprendido a soltar-me mais, investido mais tempo em actividades artísticas. Não percebo de pedagogia, mas talvez a NM consiga retirar desta semelhança algum input de valor que ajude o Baby.

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    3. Obrigada Ana! :)
      O desafio, vá, é que ele não cabe em nenhuma "caixa" (estereótipo?). É o menino mais divertido de todos, super comunicativo e alegre. Não tem problema nenhum em ser o centro das atenção (parece super seguro e sem medo de falhar), brinca muito e bem com as crianças todas (meninos, meninas, mais velhos (logo que o tratem como igual), mais novos, adapta-se e é cada vez mais tolerante)… Mas depois tem um lado… Parece mesmo um adulto principalmente na forma como argumenta e como percebe as coisas e como exige. É difícil de perceber...

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  5. Não anda por ai uma ansiedade escondida?

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    1. Isto não é um estado, é uma condição… ;) Ele é assim… Mas verdade que se agudiza quando por um motivo ou por outro andamos mais ausentes dele (mais tarefas, menos tempo de qualidade centrado nele).

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  6. Tenho uma irmã mais velha que eu 5 anos que, a certa altura, teve necessidade de ter explicações de inglês. Eu ia com ela (provavelmente na onda do 'ela tem, eu também quero' e porque gostava muito da escola) e a explicadora dava-me fichas e coisas para eu me entreter.

    Pais de filhos mais novos sofrem. :D

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    1. :) os filhos mais novos crescem sempre mais rápido…

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    2. Ainda na onda do 'ela tem, eu também quero', lembrei-me que a minha irmã tinha muita tosse para era mais pequena e tomava xaropes muitas vezes. Claro está que eu também queria. eheheh

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    3. Ahahahahahahah O Baby também diz que quer ficar doente quando o irmão está, mas é só para não ir à escola… :D

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    1. Ser perfecionista não tem mal nenhum, logo que se tenha estrutura para aguentar a imperfeição do que fazemos. Ele (ainda) não tem essa estrutura. O desenvolvimento emocional não lhe acompanha o cognitivo. Sinto-o sempre em esforço a querer absorver o mundo todo, as pessoas todas, tudo ao mesmo tempo.

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  8. Uiiiiii! Vai ser bonito! Olha pelo menos uma coisa dá para ver, o rapaz é de números e não de letras.

    PadaandLuda * Página * BlogLovin

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  9. A minha filha com 4, 5 anos, também ficava muito aborrecida por não aprender nada na escola e queria muito ter trabalhos para fazer.
    Com o tempo, a vontade para estudar passou-lhe :).
    No entanto, tenho que admitir que continua a ser uma boa aluna, embora terrivelmente preguiçosa.
    O Baby é seguramente um menino muito inteligente, aliás como o irmão também é.




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    1. A questão é que isto não tem a ver com a escola. isto tem a ver com tudo. O Baby quer aprender tudo, quer perceber tudo, tudo ao mesmo tempo e tudo que a vida lhe mostra. Ele percebe que as pessoas não o levam tão a sério quanto ele queria e isso frustra-o de sobremaneira. Ele sabe que é gente e é muito perspicaz (ainda hoje, dou mais depressa a volta ao irmão que tem oito anos, do que a ele). Mas tem quaro anos e há coisas que não entende. E eu não lhe consigo explicar e ele não aceita que não tem capacidade para mais. Às vezes é mesmo difícil...

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    2. As crianças muito inteligentes, como parece ser o Baby, têm muitas vezes esse sentimento de frustração. Tudo lhes parece pouco e que não os levam a sério.
      Mas certamente que vai tudo correr bem. Com a idade e a ajuda dos pais ele vai aprender a lidar com a frustração.
      Infelizmente (ou talvez , felizmente) todos nós, independentemente da nossa inteligência, temos que o fazer.

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    3. O desenvolvimento cognitivo dele é maior que o emocional, mas com o tempo a coisa há de se equilibrar. ele percebe (apecerbe-se, melhor dizendo) de mais coisas que as que consegue gerir. Ele percebe qualquer trejeito do meu rosto, por mais simples que seja. Se eu vejo algo em que paro para pensar (mas estamos a falar de 1 seg ou 2) ele pergunta logo o que se passa… Se eu digo que não é nada ele fica a matutar porque sabe que lhe menti, se invento uma coisa qualquer ele percebe que eu estou mentir… Não lhe escapa nada e então se não consegue fazer é um ai jesus.

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    4. O meu irmão foi assim. Apreendeu a ler sozinho ainda no infantário. Na primeira classe revoltou-se com a professora nos primeiros dias e saiu porta fora a dizer que não fazia mais uma linha (na primeira semana ainda não faziam
      Letras, só grafismos) é que se ela o quisesse na sala que tratasse de lhe dar trabalhos como deve ser. Ele ia revoltado para a escola todos os dias pq dizia que não aprendi-a nada.
      Os meus pais acabaram por o transferir para outra escola no final do primeiro periodo e ele teve a sorte de encontrar uma professora que entendia a sua sede de conhecimento é que lhe soube "dar a volta". Se as tuas educadoras estão alerta de certeza que vão conseguir dar-lhe avilta também.

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    5. Na escola já não temos problemas. Aliás, muitas vezes a Professora me conta que o dá como exemplo ao resto da sala. Foi difícil o ano passado, porque passou da sala dos 2 anos da creche para uma sala do JI 3-4-5. Ora, ele identificou-se logo com os meninos mais velhos de cinco anos com quem começou logo a brincar. O problema era quando faziam atividades por idades em que ele percebia que ao ir para o grupo dos 3 anos fazia coisas que não o estimulavam tanto, e não percebia porque o separavam dos amigos mais velhos com quem ele se sentia bem. Este ano só recebo feedback positivo, que é responsável,, que já não faz birras, é tolerante, protetor. Como já tem mais novos na sala (os de três que entretanto entraram) já percebe que tem outro "estatuto" e já está mais em paz...

      (E agora não consigo para de rir, porque não me sai da cabeça a imagem de há um ano da atual educadora quando ele passou para a sala dela, educadora esta a dois oi três anos de se reformar - imagina as crianças que já lhe passaram peças mãos, a dizer-me com uma cara muito séria: "NM, temos de falar... O Baby... O Baby é um desafio... E que desafio! " ahahahahahahah não o conhecia e no dia anterior tinha entrado em argumentação com ele... Ele a sacar de todas as palavras caras que conhecia e ela a dada altura a dar o seu melhor como se estivesse a falar com um adulto... Ahahaahahahah (been there done that))

      Eu sei que não devo sofrer por antecipação mas preocupa-me o primeiro ciclo, apesar de estar confiante que até lá ele cresce.

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  10. Encontrei a minha filha no último dia de aulas antes das férias de Natal no 1.º ano), às 10 h da noite, a chorar no quarto. Abundantemente. Preocupada, quis saber o que se passava. Chorava porque ainda não tinha conseguido fazer todos os tpc das férias. Já o irmão, sete anos mais velho, chorava no último dia de férias, enquanto fazia todos os tpc. Ambos excelentes alunos, modéstia à parte (e hoje, felizmente, bem lançados no mundo profissional). Só que a minha filha sofreu mais. Acho que o seu baby deve ser do mesmo clube...

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    1. Não sei Mrs. G, não sei… Não consigo antever. Se do mais velho tinha a certeza que ia ser bom aluno, que ia gostar da escola, do Baby não sei… É uma sensação muito estranha. Tenho a sensação que tenho a vida dele nas minhas mãos (no sentido de formação de carácter). Do mais velho não sentia isso, dele... Não sei, é difícil explicar...

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